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O caminho pelo qual segue a Flor do Amor
Detalhes sobre a ação cível movida pela Associação na Justiça Federal
Conforme relatamos nesta notícia, a Flor do Amor é uma dentre muitas associações brasileiras em busca do reconhecimento do poder público quanto ao direito de prover tratamento de saúde com Cannabis sativa a seus pacientes associados. Mais especificamente, a Associação possui uma ação cível solicitando a autorização da Justiça Federal para cultivar e dispensar — enviar a pacientes associados que possuam receita e laudo de profissionais de saúde — remédios à base da planta.
Na esteira da transparência e da abertura de dados, a Associação Flor do Amor vem a público dar mais detalhes sobre essa ação e reiterar à comunidade o compromisso de uma atuação limpa, proba e honesta.
Diante da ausência de regulamentação específica para o funcionamento das associações de cultivo, a Flor do Amor ingressou, em 2024, com uma ação declaratória constitutiva cumulada com obrigação de fazer (processo nº 1070152-36.2024.4.01.3400) contra a União Federal e a Anvisa, buscando o direito de cultivar e de dispensar produtos à base de Cannabis sativa para seus associados.
A tese é centrada no princípio da dignidade humana, na medida em que pacientes que fazem uso de medicamentos à base de Cannabis sativa para tratamento médico têm o direito de se associar com o objetivo de produzir seus próprios remédios em local e prazo determinados, buscando o melhor tratamento para suas condições de saúde. Vários paz’cientes da Associação gravaram depoimentos compartilhando suas experiências sobre o serviço prestado pela Flor do Amor e o impacto do tratamento em suas vidas.
O pedido feito pelos advogados da Associação, que inclui uma tutela de urgência, destaca a necessidade iminente de garantir a continuidade do tratamento de seus atuais 586 paz’cientes, evitando danos irreversíveis à saúde dessas pessoas. A ação argumenta que a omissão da União e da Anvisa cria um vácuo regulatório que prejudica diretamente os pacientes e reforça a necessidade de um amparo judicial imediato.
A petição se fundamenta na Lei Federal nº 11.343/2006, que permite o cultivo para fins medicinais e científicos mediante autorização, e na Constituição Federal, garantindo o direito à saúde e à dignidade da pessoa humana. Além disso, também destaca o precedente favorável de diversas outras entidades que obtiveram decisões semelhantes.
Segundo Samantha Reis, coordenadora jurídica da Flor do Amor e advogada criminalista especialista em Lei de Drogas, a ação cível é um marco não só jurídico, mas também ético: “É um manifesto pelo direito ao cuidado coletivo, pela dignidade de quem depende da cannabis para viver bem e pelo direito de acesso dos associados às diversas formas de administração terapêutica da planta. Defendemos que o Estado, ao demonstrar omissão na regulamentação desse direito, se ausenta do seu papel de garantidor da vida e da saúde, perpetuando o sofrimento evitável de pessoas em situação de vulnerabilidade clínica e econômica. É a partir dessa omissão que a sociedade civil organizada se associa, para garantir o direito imediato e urgente daquela comunidade. A judicialização é uma necessidade imposta diante da ausência de regulamentação e cada linha da ação reflete o nosso compromisso com a vida das crianças, adultos, idosos e animais que dependem do tratamento associativo garantido pela Associação Flor do Amor”, afirma.
João Pimenta, presidente da Flor do Amor, destaca que o trabalho da Associação vai além do auxílio aos paz’cientes com a dispensação dos remédios: “Também cumprimos um papel que altera a cultura brasileira, trabalhando a epistemologia da nossa sociedade, ou seja, a forma como a gente compreende as coisas da vida. Porque essa planta, durante muito tempo aqui no nosso país, por parte considerável da população, era vista unicamente como malefício. E hoje nós somos atores de uma história que vem se aproximando cada vez mais da verdade, das raízes culturais antigas. Transformamos essa compreensão cultural da nossa sociedade, esclarecendo que ela é um remédio, que ela é uma medicina importante, inserindo-a na cultura brasileira”.
De acordo com ele, isso só é possível graças ao Poder Judiciário, em que pesem as diversas críticas da sociedade. “No atual sistema de governo, é o poder que vem respaldando a existência dos organismos associativos que trabalham com a Cannabis sativa. Vejo a ação cível da Flor do Amor como o caminho que a planta encontrou para abrir espaço na sociedade e se colocar como um elemento a ser usado, a ser ativado, uma ferramenta para espalhar mais amor e carinho entre os seres humanos”, diz João.
O papel das associações no cenário nacional
Entendemos que as associações de pacientes desempenham um papel fundamental no acesso seguro ao tratamento, atuando onde o Estado ainda falha em fornecer alternativas acessíveis e regulamentadas. Para muitos, as associações são a única opção viável diante do alto custo dos produtos importados e da burocracia para obtenção de medicamentos à base de Cannabis sativa no país. A ausência de regulamentação clara faz com que o funcionamento dessas entidades dependa de decisões judiciais individuais, criando um cenário de incerteza e instabilidade.
O Projeto de Lei nº 399/2015, que visa regulamentar o cultivo e a comercialização de produtos à base de Cannabis sativa, representa um avanço importante, mas ainda aguarda aprovação no Congresso Nacional. A última ação legislativa referente ao projeto aconteceu em junho de 2021.
Enquanto a legislação não avança, a Associação Flor do Amor e muitas outras continuam de empenhando para garantir que seus pacientes tenham acesso seguro e contínuo aos tratamentos que necessitam. A mobilização dessas entidades, somada ao apoio da sociedade civil e ao avanço do debate, é essencial para que o Brasil evolua em sua política sobre o tema.
Na opinião de Samantha Reis, as associações são o elo mais forte entre o caos da proibição e a dignidade do acesso: “Elas não apenas preenchem a lacuna deixada pela omissão estatal, como também criam jurisprudência viva. Cada ação judicial movida por uma associação é uma pressão legítima no sistema. Além disso, humanizam o debate, mostrando que por trás de cada planta existe uma história, uma urgência, um direito. As associações contribuem para uma nova realidade sobre a cannabis no Brasil, que parte da autorregulação — e fazem isso com muita técnica, responsabilidade e muito amor”.
Para ela, apesar da lentidão institucional, a regulamentação caminha. “Estamos avançando a partir das margens: mães cultivadoras, associações de pacientes, advogados ativistas, médicos corajosos. A judicialização tem sido o principal motor dessa transformação. O avanço é fragmentado, porém constante. Cada habeas corpus deferido, cada autorização de cultivo, cada paciente que consegue acesso digno ao tratamento representa um passo. O Estado pode até fingir que não vê, mas a regulamentação já está sendo construída na prática”.
João Pimenta relembra o histórico de nascimento da associação e reforça os principais valores que norteiam a existência da organização: “A Flor do Amor nasceu em 2022 da união de pessoas que acreditavam na força espiritual da Ganjah. Antes de mais nada, nós acreditamos, sabemos, sentimos que a planta traz a frequência do amor para a nossa sociedade, para todos que se dedicam ao uso asséptico dela, ou seja, uma forma de uso que não é social, recreativa, misturada. É um uso devocional. Compreendemos que ela é responsável por trazer a frequência do divino amor, pois é vinculada à linhagem dos patriarcas, às linhagens africanas, do conhecimento védico, linhagens de muita sabedoria para a humanidade. Então, quando começamos essa história, começamos conectados com essa raiz ancestral, sabendo que nossa força viria daí. E cumprimos na sociedade o papel de um organismo comunitário, composto de múltiplas vozes,intenções e sentimentos”.
O fortalecimento das associações de pacientes não é apenas uma questão de regulamentação, mas um passo fundamental para assegurar o direito à saúde e à dignidade de milhares de brasileiros que dependem dessa terapia.
A Flor do Amor segue firme nessa nobre missão, buscando não apenas o reconhecimento legal, mas também um futuro onde essa erva, que sempre foi livre, volte a ser plenamente acessível aos que dela necessitam.
Texto: Pedro Turbay
Arte: Sonam Henry
Revisão: Alexandra Joffily